26 de abr. de 2009

Tia Filó




Titia dividia seu sofá-cama com sua amante Zig. Um dia, vadia, já de saco cheio da família, me falou assim: “minha sobrinha linda, que eu amo muito e muito, hoje vou-me embora pra Passárgada!”, e mudou-se com seu amor pra Espanha. Filomena e Zigfrida, amando-se em plena praça, em frente à Sagrada Família… Isso era gostoso de imaginar quando ela me dizia!
E nessa época eu nem sabia “onde” ficava Passárgada!


Patrícia Gomes
Imagem e mote: Jhonny Russel

22 de abr. de 2009

Orações Inúteis



um sol menor
lá fora
espalha-se

e eu, em conclave,
não sei se ardo
ou se rezo

se absinto-me
ou gotejo em vermelho
espesso, caudal

respingo orações inúteis
de uma deusa
enluarada e macilenta
que empanzino-me

ah! pobre poeta vulgar
que derrama soluços
entre os cacos das garrafas

e do amor?...


nada!

Patrícia Gomes
Imagem: Hugo Logg

21 de abr. de 2009

Suficiente


Acreditei que bastaria
Ir embora de casa
Escrever longas cartas
Cortar as madeixas
Virar o rosto quando
Se fizesse noite

Mas que nada!

O amor foi contundido
Confundiu as ferragens d’alma
Enroscou em meu corpo
Um informe grilhão

Achei suportável certas misérias,
Ouvi-o rosnar debaixo da lua
Até mesmo em dias de chuva
Pensei que pudesse ser abandonado
Qual nada!

Com amor errado
Só cometendo assassinato!


Patrícia Gomes
Imagem: Oana Cambrea

20 de abr. de 2009

Pilhérias



Num chiste qualquer
cantei, por engano,
o padeiro.

E da literatura
que eu queria
com o livreiro


Sobejos de broa!



Patrícia Gomes
Imagem: J. Garcia



Patrícia Gomes
Imagem: J. Garcia


19 de abr. de 2009

Teu

Teu corpo é mel que escorre
em minha boca vadia
lambuza meu corpo
num sopro de fome
de sede e desejos
torrente que me lava quente
em veios de vulcão

Tus dentes quando se cravam
à minha pele
atiçam mais do que paixão
uma dor que alivia tensões

Meu amor, meu homem,
meu macho e desejo

No teu corpo, só eu me atrevo
na tua boca, só eu me sacio
nos teus pensamentos
só eu quero achar-me perdida
mas é em teus sonhos
que
quero que me dê morada...

Patrícia Gomes

Imagem:

Peter Wattendoff



18 de abr. de 2009

Moribunda


Fez silêncio em meu papel
A poesia dá ares de morta
E meus dedos sequer
Tentam ressuscitá-la.

Mas por quê?
Você ainda me pergunta!

De que me adianta escrever
Rimas e versos
Trabalhar sonetos
Gravar nas janelas os suspiros,
Romper o dia em elegias,
Declamar meus sentimentos
Se você não está apto e nem
Dá-se ao trabalho de vê-las?

Não sou apenas reclames
Como gosta de conclamar.

Minha carne arde por muito
Mais que línguas despropositadas
Em bailes poéticos sem fim...

Minha poesia quer anunciar
Línguas que se conjugam,
Corpos que bailem juntos
Mesmo que seja com as canções
Do Wonder e do tal do Rei...

Minha poesia está moribunda!

Amortecida pra você
Que saiu assim, sem ao menos
Dizer adeus, até breve
Sem deixar uma entrelinha
A mais na estrofe prescrita
Em ignóbil estilo...

Se a minha poesia morre pra você
Não me acuse, não sei de nada.

Juro que não fui eu...


Patrícia Gomes
Imagem: Filipa Mateus

17 de abr. de 2009

Emoção In Natura



Indico-me o presente que não aponto
Entrelaço os dedos e seguro o queixo
Com as costas da concha que se forma,


Enquanto, em “trip” estranha, sentindo frio,
Busco um corpo que preciso quente
Aquecendo-me nessa hora alheia
Que me vejo insípida e tão nua…


As mãos atadas me fisgam
E, enquanto olho, tento não sentir

Sua voz reverberando
Em cada filigrana de pele
Que me recobre o corpo,

Vejo nas costas da palma mão fechada
O que dizem ser o meu coração,
Pasmo no que percebo

E já não sei como lhe dizer…

Tanto sentimento em músculo tão pequeno
Que bate oco em parco sangue que bombeia.

Nessa visão explico a vertigem que sinto
Constantemente: Falta oxigenação na razão
que, tresloucada, não me acena o rumo


Para escapar da falta de você,

Ou qual o caminho pra lhe deixar de vez…




Patrícia Gomes
Imagem: Anca

16 de abr. de 2009

Vertigem


Na tarde dominical
Acordamos com o florescer
Das flores do edredom
Que nascem
Gozam
Murcham
E no abrigo morno, brotam
Beijos sem batom
Que sorriem entre café
E pão-de-queijo
Enquanto o dia
Esvai-se ligeiro
Sereno e, de novo,
O edredom floresce
Luas e estrelas.


Patrícia Gomes
Imagem: Desconheço autoria - Via Google

15 de abr. de 2009

Aliciando



Num contorno qualquer
No país das maravilhas
Os ruídos serenos vazaram em azul
Enquanto meus nervos vermelhos
Vagavam, vibrantes, pelas veias tortas


Nas brasas de cigarros vagabundos
Queimei o jardim de naipe copas
E na ferrugem da lata de leite
Vingou a flor roxa do desejo


Sem guilhotina e nada no avesso

Fios vermelhos de sentimentos
Queimaram totalmente o silêncio
E a água da chuva no espelho
Era o reverso do medo...



Patrícia Gomes
Imagem: Jarek Kubick

13 de abr. de 2009

Inglório


Que espaço é esse,
Doado ao dia,
Onde mal adormeço?

Lá fora as folhas
Úmidas e amareladas
Amanhecem outono

E o gato afia suas garras
Mirando a brisa que enverga
A roseira da casa ao lado

Coroa de espinhos
Irônico vento...

O mundo gira
E nenhuma glória me acode...



Patrícia Gomes
Imagem:
Nullermanden

12 de abr. de 2009

Conjecturas

Queria entender o que há em mim que me governa assim, meio que desgovernadamente. Corro tantas vezes em círculos, assim como em linhas retas, das quais não gosto e nem quero, mas corro. Queria entender esse labirinto no qual me vejo inserida mesmo quando tudo o que quero é a vastidão de uma planície de céu, ou um mergulho na calma ondulante do mar. E, no entanto, há uma sigla médica que poderia muito bem me definir, mas aí é outra questão que não sei bem se quero ter como uma justificativa ou como mais um rótulo preso ao meu corpo. Agora eu gostaria de beber algo forte, mas não busco a embriagues, como muitas vezes o fiz, achando que seria o caminho mais curto e fácil para conseguir adormecer. Gostaria, apenas, da leveza sustentável fluindo do sangue para a pele, a liberdade de me desfazer de certas fronteiras que me seguram onde estou. Quero ir pra fora desse lugar onde me encontro, correr em campos mais úmidos e frescos, onde pudesse sentir as palavras me envolverem me dando vida...


Agora eu só gostaria de saber escrever o que nem sei direito, mas que sinto...


Imagem: Ledesma Millennium


11 de abr. de 2009

Abrigo Desejos




Na noite que nasceu há pouco
Vago só, e se contigo estivesse
Ah! Que abrigo luxu[ri]oso teríamos...

Não precisaríamos de ventos,
Bússolas ou qualquer iguaria,
Só o rastro da lua como guia...


Éden em festa seria essa noite,
Que agora chora, se, oxalá, pudesse
Em teus braços ancorar...



Patrícia Gomes
Imagem: Elena Getzieh

10 de abr. de 2009

Bacanal



Comi teu coração
servido em um banquete
às bacantes.

Vomitei vinho
de purpúreo
agridoce

Tresloucada dancei
com Baco agarrado
às pernas bambas

Tonta,sem pensar
nem sonhar,
repousei…

Morfeu é um bom amante!


Patrícia Gomes
Imagens: Via: google.j

8 de abr. de 2009



Pra conseguir vestir-me de céu
em arames me arranhei
dilacerei a carne em dores
nada fantasmas e me exilei

Exilada de mim trilhei
vagos labirintos meus
e deixando rastros dormentes
lágrimas erengeladas
me deixei cair...

Na queda deparei-me
com as asas em vôo
num céu aberto
e nesse olhar mergulhei
começando a descobrir
o real caminho para me vestir...


Patrícia Gomes
Imagem: Stacey Ann Borg

5 de abr. de 2009

Fios


Nos fios tensos
elas pousavam
e cantavam o amor...

Veio então o vendaval
e no fio tenso
nenhuma andorinha sobrou...




Patrícia Gomes
Imagem: Desconheço a autoria.