3 de jan. de 2013

Resenha: Os Íntimos - Inês Pedrosa


Cinco homens à mesa de um restaurante. Comida, futebol, conversas. Às vezes sobre mulheres, nunca as próprias. Afonso, Pedro, Augusto, Guilherme e Filipe. O mesmo grupo, o mesmo restaurante, a mesma sensação de intimidade capaz de suspender a solidão por algumas horas. Este é o núcleo central do último livro de Inês Pedrosa, “Os íntimos”. É a partir dele que se irá desenvolver a narrativa. Ambientada em Lisboa, ficcionalizando os modos de vida dos portugueses na atualidade, tem nesta pulsação da vida contemporânea uma característica interessante podendo, inclusive, contribuir para se desfazer a visão estereotipada que ainda se tem sobre os portugueses.


Acredito já ser do conhecimento de quem me acompanha por aqui e ou pelo canal do youtube que sou uma grande fã e apreciadora das obras da escritora portuguesa Inês Pedrosa. Então foi com muita ansiedade que esperei a hora mais acertada pra me entregar à leitura de seu mais recente lançamento por cá: Os Íntimos.

Depois de ler o estupendo Fazes-me falta e o belíssimo Nas tuas mãos, não conseguia segurar a expectativa para o seu próximo romance. Então, por medo, ou até mesmo por uma espécie de felicidade clandestina, adiei a leitura ao máximo, e só me rendi a ele em dezembro, e a resenha só me atrevi a fazer agora porque ainda queria esse travo agridoce na boca só pra mim, ao menos por um pouco mais de tempo.

Em Os Íntimos, Inês Pedrosa  nos apresenta um romance que é quase todo em  monólogos; onde, num ato de extrema coragem, fala pelos homens e como se ainda fosse pouco, do que pensam e falam das mulheres!
Cinco amigos que se encontram para conversar, dar risadas, falar de política, futebol, de seus tiques, manias e das dores que os cercam,  tudo dentro da mais perfeita contemporaneidade, tudo muito próximo do que nos condiz chamarmos de vida real.

Mesmo todo o romance tendo apenas uma personagem feminina, que é a Célia, filha do dono do bar/restaurante, e que os serve uma vez por mês e sorri de seus gracejos para com ela, Inês nos brinda com histórias que estão totalmente atreladas ao feminino, como a de Afonso, médico oncologista que perdeu mulher e filha e está sempre refletindo sobre esses fatos e as duas.

É de Afonso a principal voz narrativa, que representa uma das faces do homem moderno e, ao meu ver, o mais complexo e intenso dos 5 amigos da trama. É ele quem apresenta seus amigos, e é por meio de seus pensamentos que a autora dá uma alfinetada com classe, ironia e bom humor, mandando um recado às mulheres diante dos avanços femininos em diversas áreas:

A emancipação das mulheres parece ter-lhes aguçado um espírito 
científico perturbadoramente materialista. (...) Acabaram-se os bons 
sentimentos das mulheres: a timidez, o pudor, a culpa, a entrega 
desinteressada, enfim, a compaixão. É melhor nem pensar nisso.
(p.29).

Augusto, administrador de uma empresa discográfica, é o que mais se assemelha em gostos e costumes à Afonso. Ambos têm fama de conquistador, relacionaram-se com a mesma mulher, em diferentes momentos, e adoram gabar-se de suas conquistas, cada um a seu modo, claro.

Pedro, o técnico de informática, sem namorada, amante ou esposa,  prefere manter-se fechado e distante do mundo, mas sempre ligado à mãe e, em contrapartida, demonstra profundo conhecimento da alma feminina: 


“O que eu sei das mulheres, 
meus amigos, é isto: elas são muita gente ao mesmo tempo. Como se trouxessem 
todas as variedades da vida dentro de seus corpos. Elas são feiticeiras e anjos e 
putas. E homens também.” (p. 37)


Já Guilherme é o personagem que decidiu não ser nada. Criado por um pai militar que o envia para um colégio militar pois este queria ver o filho um general ou médico. Após sair da instituição e livrar-se dos rígidos costumes, se emprega na área da farmacêutica onde conheceu sua grande paixão: Clarisse.

Por fim, conhecemos Felipe, um aspirante a artista que, no alto do seu egocentrismo, se julga injustiçado com relação ao talento, bem como ao da sua esposa,  e se dirige com superioridade a todos.
Segundo apresentação de Afonso,

“Filipe é um interesseiro incapaz de identificar seus 
próprios interesses. Um falhado que persiste na falha. Um miúdo imune à 
introspecção. (...) O louco da aldeia que confirma a sanidade mental dos outros.” 
(p. 160).


Diante de tantas diferenças entre si, cada um se mantém fiel aos seus encontros mensais, numa convivência marcadamente íntima que, a despeito de tudo o mais, nos fala mais alto e forte sobre o desejo e a necessidade de não estarmos sós.

Os Íntimos, ao lado de Fazes-me Falta e Nas tuas mãos, é, sem sombras de dúvida, a tríade imbatível da escrita maravilhosa dessa força que Inês Pedrosa.
E volto a afirmar: se ainda não conhece a escrita dessa mulher, não perca mais tempo! ;oD



Os Íntimos
Inês Pedrosa
Editora: Alfaguara
200 páginas


Resenhas ótimas:




4 comentários:

Tati disse...

Que curiosidade Pati!! Eu consegui terminar o Fazes-me falta e realmente, é uma obra prima. De partir o coração, mas só fez despertar minha curiosidade para conhecer mais da Inês. O outro livro que eu tenho dela aqui em casa é A Instrução dos Amantes, mas fiquei muito curiosa com esses outros que você citou.
Beijos
Tati

Anônimo disse...

Tenho o Fazes-me falta aqui, Pat, e morro de medo de lê-lo por causa do tema, mas um dia tomo coragem. Tenho que ler algo dela ainda esse ano. Talvez esse Os Íntimos fosse uma maneira de começar. ;-) Beijo!

Juliana disse...

ainda não li Os íntimos. Sou LOUCA pela Inês. Nas Tuas Mãos me virou do avesso. Cê leu A Eternidade e o Desejo?

Cê acredita que perdi o Fazes-me falta numa viagem?

ulysses rocha disse...

Gosto muito dos romances de Inês Pedrosa... o que me encanta na obra pedrosina (este termo está em minha tese de doutorado) é o tratamento do tema da morte aliado à amizade. Até por isso, a narrativa torna-se poética. Outros dados interessantes: o tratamento dado ao erotismo, a concepção feminista, o arcabouço narrativo cíclico e espelhado além da fina ironia...